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terça-feira, 1 de junho de 2010

O Primeiro Beijo

Eu tinha treze anos, estava na sétima série, o que seria o sexto ano atualmente. Meus pais e eu nos mudamos em setembro. Então eu tinha um final de ano para me adaptar. Adaptação pode ser algo problemático nesta idade, porém eu era aventureira.

Deixei uma escola católica em São Paulo e fui estudar numa escola pública em Tucuruí, no meio do nada. Meu primeiro dia foi estranho. Os alunos faziam marcenaria e eu nunca tinha chegado perto de uma lima, de uma serra, ou mesmo de madeira, a não ser as dos móveis de casa. Em São Paulo, a professora, uma freira, tentava nos ensinar a bordar. Que diferença!

Pelo menos a escola era um ambiente democrático. Todos a freqüentavam, não importava que posição na empresa ou nos órgãos governamentais os pais desempenhassem. Este tipo de preocupação nunca me afetou, embora eu devesse esta tranquilidade à inteligência do meu pai, que sempre foi brilhante, embora ele pudesse falhar em outros aspectos. Os colegas que freqüentavam a escola comigo eram os mesmos que moravam ao meu lado, ou quase os mesmos com alguma diferença. Afinal, a cidade era um povoado e praticamente todos se conheciam.

Eu tinha um colega com quem eu conversava bastante nos últimos tempos. Seus pais eram muito legais! Eu já os tinha conhecido. Éramos colegas de classe. Então, eu resolvi que queria ficar mais bonita.

Desci ao salão de beleza, que era algo bem familiar, porém longe de casa. Apareci por lá logo depois do almoço e foi quando eu tive minha primeira lição de preconceito. Encontrei no salão de beleza algumas professoras, algumas vizinhas. Muitas mulheres entravam e saíam rapidamente. Enquanto isso, eu ficava ali, esperando minha vez que nunca chegava.

Fazia parte de minha rotina ir à piscina todos os dias e passar a tarde toda lá, logo depois que chegava da escola e almoçava. Naquele sol equatorial de 40°, naturalmente morena, a melanina me protegia ainda mais dos raios solares, então eu vivia realmente muito queimada. Mas não era um queimado vermelho, era um queimado dourado, do tipo indígena, tupi-guarani, como eu recebera de herança da minha bisavó. Ainda assim, eu tinha cabelos finos, viviam ressecados, só possuíam oleosidade na raiz, porque as pontas ficavam tão queimadas que meus cabelos deixavam de ser lisos.

Bem, a ignorante da dona do salão, cometeu o maior fora da vida dela, quando ao final do dia, minha irmã e uma vizinha vieram me buscar, pois minha mãe estava preocupada com a minha demora no salão de beleza. Então a cabeleireira perguntou:

_Você trabalha na casa dela?

_Não, eu sou sua vizinha! Em Tucuruí, os vizinhos ocupavam a mesma função na empresa. Foi aí que a mulher descobriu que o marido dela deveria ser subalterno do subalterno do meu pai. Neste momento, eu nem precisei falar. Só olhei com desprezo, e nunca mais voltei naquele muquifo.

Desde então, descobri como não se deve desprezar ninguém, muito menos fazer julgamentos precipitados. Aprendi a lição da sombra e do espelho. A melhor vingança para uma ofensa é voltar para o outro sua insignificância refletida no espelho. Já a lição da sombra é a que diz que se você se esconde descobre mais fácil o pior dos outros.

Apesar dos pesares, consegui arrumar o cabelo. No dia seguinte, o Fabiano estranhou:

_O que você fez com seu cabelo?

Puxa, como os caras conseguem ser insensíveis, quando você passa horas no salão, preocupada em ficar mais bonita. Tudo o que eles conseguem dizer são estas observações ridículas. E a gente ainda se preocupa em agradar!

Reclamando ou não, a verdade é que em uma semana eu e o Fabiano combinamos de nos encontrar no clube, no final da tarde. Porém, começou a chover. O dia ensolarado tão comum virou cinzento, nublado e chuvoso. Eu tinha chegado antes, afinal, morava ao lado do clube. Mas não sabia que iria chover tanto, então já estava pensando em ir embora. Quando estava pegando minhas coisas para ir embora:

_Oi, desculpe a demora. Tudo bem?

_Tudo bem. Eu já estava desistindo de esperá-lo. Acabei de guardar minhas coisas para ir embora.

_Então, eu a acompanho.

_Tá bom!

Fomos andando devagar apesar da chuva, que pingava e nos encharcava. Então, ele pegou minha mão. Virou. Ficou de frente para mim. Aproximou o rosto e me deu um beijo. Eu correspondi. Foi o primeiro beijo que eu ganhei. Eu tinha ouvido as conversas de amigas que já tinham beijado, de como deveria encostar a língua, como usava os lábios, como chupava devagar...

Foi bom, mas estranho. A primeira sensação foi a vontade de secar a boca, mas eu não poderia fazer isso, porque significaria que eu não tinha gostado do beijo. E se eu estava esperando justamente que este beijo acontecesse, não poderia de jeito nenhum demonstrar nojo ou falta de desejo. Também não queria que ninguém soubesse que eu ainda não tinha beijado.

Adolescente sofre muito. É uma pena que os pais cresçam e se esqueçam disso.

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